GUERRA ENTRE ISRAEL E HAMAS - TRABALHO DE FILOSOFIA/CIDADANIA E DESENVOLVIMENTO 11ºB
A guerra entre Israel e o Hamas tornou-se “A Escolha de Sofia”.
Imagine um comboio desgovernado a dirigir-se para seis pessoas amarradas aos carris. Deve desviá-lo para que apenas mate uma pessoa? A maioria das pessoas pensa que sim, quando se trata de uma questão abstrata, mas recusa empurrar uma pessoa grande de uma ponte para parar o comboio. Interessante. Mas aqui está um dilema verdadeiramente agonizante: devem os israelitas atacar Gaza sabendo que crianças palestinianas morrerão e que o Hamas executará reféns um a um se o fizerem? Se for um utilitarista radical, poderá tentar justificar isto como o sacrifício de relativamente poucas vidas para salvar muitas futuras vítimas. Mas a guerra não é uma experiência mental.
As consequências a longo prazo das ações não são previsíveis. Matar um combatente do Hamas poderá inspirar mais 10 a pegar em armas contra Israel. Um ataque poderá falhar, e os soldados israelitas poderão ser todos mortos juntamente com os reféns. Mas a inação também é uma escolha, e tem consequências. Pode encorajar o Hamas e dar-lhe tempo para se reagrupar e renovar os seus ataques, talvez com um aumento da barbárie.
Então, a solução passará por conversações de paz? No entanto, como pode confiar num inimigo que assassinou tão alegremente civis? A ideia de enfrentar uma força bárbara com outra força bárbara não parece sensata. Olho por olho constitui uma receita para a escalada e reduz o que retalia ao mesmo nível do que ataca. Muitos filósofos assumem que há uma resposta certa em situações como esta, mesmo que seja difícil descobrir qual é. Em retrospetiva, talvez, torna-se mais óbvio — em alguns casos. Mas sou cético quanto a haver sempre uma resposta certa para a pergunta "O que devemos fazer?". Existem, no entanto, geralmente, muitas respostas erradas. Algumas circunstâncias em que nos encontramos não autorizam nenhuma solução moralmente certa, e nem mesmo uma óbvia "menos má". Este é um aspeto trágico da vida. Somos como a personagem n’A Escolha de Sofia1, forçados a decidir entre diferentes escolhas inaceitáveis (salvar o filho ou a filha, mas não ambos. Se não escolher, ambos morrerão).
Para aqueles que desejam um fim pacífico e justo para esta guerra, está longe de ser óbvio como isso poderia ser obtido. Se quer um fim para os assassinatos, dirão alguns, pare de matar, de todo. Mas há circunstâncias em que depor armas levará à sua própria destruição. Uma resposta errada é a de ignorar a humanidade daqueles que o estão a atacar, mas há alguma certa? Em O Existencialismo é um Humanismo, Jean-Paul Sartre fala-nos de um jovem estudante que veio ter com ele com um verdadeiro dilema moral. Deveria ficar e cuidar da sua mãe na cidade de Paris ocupada pelos nazis ou deveria tentar juntar-se aos Franceses Livres para lutar pelo seu país? O estudante pediu conselhos a Sartre. Havia argumentos fortes de ambos os lados. Mas o único conselho que Sartre lhe deu foi o de escolher por si mesmo. Não havia uma resposta certa, exceto agir como se o mundo inteiro o estivesse a observar, como se ele fosse um exemplo moral para a humanidade.
A falta de diretrizes sobre como devemos viver é apenas parte da angústia da existência, mas isso não remove a responsabilidade pelo que escolhemos. A barbárie não é a resposta, mas isso não significa que alguém saiba qual é a resposta certa, ou sequer se existe alguma.
Baseado em Nigel Warburton, “A guerra entre Israel e o Hamas tornou-se a Escolha de Sofia”, in Everyday Philosophy, 18 de outubro de 2023
1. A “Escolha de Sofia” é uma expressão que deriva do romance de William Styron, publicado em 1979, e do filme subsequente lançado em 1982. O termo é usado para descrever um dilema moral no qual uma pessoa é forçada a escolher entre duas opções igualmente terríveis. No contexto original, Sofia é uma mãe polaca num campo de concentração nazi que é forçada a escolher qual dos seus dois filhos será poupado da câmara de gás. Se ela se recusasse a fazer uma escolha, ambos seriam mortos.
2. Depois da leitura e análise do texto, foram colocadas algumas questões, procurando-se articular algumas das aprendizagens essenciais da disciplina de filosofia, nomeadamente: A necessidade de fundamentação da moral - a ética utilitarista (Stuart Mill) e a ética deontológica (Kant) -, com os domínios dos Direitos Humanos e da Interculturalidade. Eis as questões:
1. Na perspetiva de um utilitarista, como justificarias a ação de Israel atacar Gaza, sabendo que isso iria resultar na morte de civis? E na perspetiva de um deontologista?
2. O que significa o princípio de "olho por olho", neste contexto? Considera-lo uma abordagem ética viável à resolução de conflitos?
3. Acreditas que as regras éticas se aplicam em cenários de guerra? Ou a guerra suspende todas as normas éticas?
4. O texto sugere que a inação também é uma escolha com consequências. Concordas? Pode a inação ser moralmente condenável?
5. Jean-Paul Sartre fala sobre a angústia da liberdade de escolha. O que é que isso significa e como se relaciona com o dilema apresentado no texto?
3. A partir destas questões discutiu-se o problema da guerra, chegando-se as seguintes conclusões:
- Na perspetiva de um utilitarista, a ação de Israel atacar Gaza, sabendo-se que isso resultará na morte de civis, poder-se-ia argumentar que se a longo prazo mais vidas fossem salvas, então a ação seria justificada. Na perspetiva de um deontologista poder-se-ia contestar qualquer ação que viole um princípio moral, como o de não matar inocentes, independentemente das consequências.
- Neste contexto, o princípio de “olho por olho”, pode levar a um ciclo interminável de vingança e violência. Portanto, embora possa parecer justo à primeira vista, pode não ser uma solução ética sustentável.
- Algumas pessoas argumentam que as normas éticas devem ser mantidas, mesmo em tempos de guerra, para evitar atrocidades e proteger os direitos humanos. Outras argumentam que a guerra é um estado excecional que requer as suas próprias regras.
- Partindo do princípio de que a inacção é uma escolha com consequências, ela pode ser moralmente condenável se a pessoa tiver o poder de evitar um mal maior e optar por não agir.
- Sartre sugere que a liberdade de escolha vem com a responsabilidade de fazer a escolha "certa", o que pode ser angustiante. No contexto apresentado no texto, isso poderia significar ponderar cuidadosamente as consequências éticas de qualquer ação ou inação.
4. Balanço da atividade.
Com esta atividade, que articulou aprendizagens essenciais de Filosofia e a área da Cidadania e Desenvolvimento, pretendeu-se que os alunos desenvolvessem a sua capacidade de leitura crítica desta atual e cruel realidade – que é a guerra -, através da colocação de questões que proporcionaram uma reflexão séria sobre o problema da guerra e as suas consequências para a humanidade, reforçando, assim, o estatuto da aula de Filosofia como «o lugar do exercício da Cidadania, da Autonomia Intelectual e de defesa dos valores e princípios da Democracia».
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